Foi rápida, demasiado rápida. A flash interview de Helton em Famalicão, após a segunda derrota consecutiva do FC Porto, merecia a quebra de protocolos para se prolongar no tempo. O guarda-redes demonstrou naquele momento que tinha muito para dizer.
Helton não falou do adeus à Taça da Liga ou do seu erro no golo decisivo. Não era aquilo que mais importava naquele momento. Percebeu que era a oportunidade rara – os jogadores têm cada vez menos voz – para se assumir como capitão de um grupo em manifesta crise de confiança e deixar algumas ideias essenciais.
«Assumir», desde logo. A expressão repetida, sem margem para dúvidas. Os jogadores do FC Porto devem reconhecer as próprias falhas e admitir que nem tudo se explicava pela castradora gestão técnica e humana de Julen Lopetegui. Ou por nítidas falhas da estrutura portista face a essa realidade e ao que se seguiria.
O problema que aqui se coloca – evidente neste período de transição até José Peseiro – é que Helton é uma das poucas referências no balneário azul e branco. Qualidade (com alguns desequilíbrios) não falta, é certo, mas a maioria dos jogadores não estava sequer no clube quando Vítor Pereira conquistou o último título de campeão.
Helton, Maicon e o regressado Varela. Três curtas exceções à regra num grupo que tem convivido essencialmente com objetivos por concretizar. É natural, portanto, que o plantel esteja «desconfiado», como disse José Peseiro numa apresentação com nota positiva.
Quando os mais jovens e menos experientes, sem a cultura de sucesso tradicional daquela casa, se deixam levar na espiral de incerteza têm de encontrar à sua volta referências. Portos de abrigo. Não só no banco de suplentes, não só nos camarotes. No seio do próprio grupo.
A imagem de André André - um jogadores com potencial para se assumir como voz de comando - em Guimarães ficará para a história da época 2015/16.
Recordo vários momentos da época do FC Porto em que Helton, mesmo na sombra de Iker Casillas, desempenhou em justa medida o seu papel de capitão. Durante o jogo não relaxa, gesticula a partir do banco, incentiva, dá instruções, bate palmas. No final, festeja em caso de vitória ou é invariavelmente o primeiro a tentar reunir o grupo para pedir desculpa aos adeptos.
«Não vou deixar de torcer, deixar de amar, deixar de lutar. No que for preciso, o Helton vai ajudar, mesmo de fora.»
Ninguém duvida. Para lá da análise técnica – errou em Famalicão, claramente, como Casillas errou em Guimarães -, o guarda-redes passa com distinção no exame de consciência.
«Como capitão, desejo que o mister (…) nos ajude, que é que nós nesta altura estamos a precisar. Temos de nos ajudar e temos de ser ajudados. É por aí. É trabalhar.»
Quem acompanha com regularidade o FC Porto percebe que dois jogadores se destacam no banco de suplentes. Hélton, acima de todos, e Rúben Neves. Quando não está no onze, o jovem senta-se ao lado do guarda-redes, ouve-o e segue o exemplo.
Com 18 anos, é arriscado pedir a Rúben que cumpra todas as obrigações inerentes à braçadeira de capitão. É, antes de mais, injusto para quem acaba de chegar à maioridade.
O futuro do FC Porto passará seguramente por Rúben Neves, por outros como André André ou Danilo Pereira, mas o clube tem de segurar figuras que assumam a transição.
No fundo, o plantel precisava de encontrar por ali dois, quatro, seis Ruis Barros. Ou Héltons. Homens com espírito de missão, conhecimento de causa. E voz.
Quando a braçadeira de capitão anda pelos braços de Héctor Herrera ou Martins Indi, por exemplo, é importante lembrar que nem um nem outro conquistaram sequer um título com a camisola azul e branca.
O mexicano, Dragão de Ouro por sinal, tinha acabado de chegar ao clube e foi suplente não utilizado no último festejo coletivo do FC Porto: a Supertaça de Portugal, a 10 de agosto de 2013. Quase tudo mudou desde então.
Entre Linhas é um espaço de opinião com origem em declarações de treinadores, jogadores e restantes agentes desportivos. Autoria de Vítor Hugo Alvarenga, jornalista do Maisfutebol (valvarenga@mediacapital.pt)
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